quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Releitura


Olho pro passado. É o que faço todo dia, por muito mais tempo do que alguém deveria olhar. Não é tão fácil assim a gente olhar pra frente. É incerto, não tem chão. E sinceramente, dá preguiça. Construir todo o castelinho de areia outra vez, pra vir um vento e desfazê-lo - porque sempre vem, eu sei. Olhar pra trás é mais fácil. "Difícil é esquecer quando se tem amor". E em todas as vezes que olhei, vi diferente. Compreendo motivos e, então, não entendo mais nada. Me sinto amada para, no segundo seguinte, desiludir.
A verdade é que já fomos muitas coisas, sentimentos e pessoas diferentes. Somos mutáveis, nós dois. Passamos por muito. Mudamos idéias, erramos, acertamos. Sempre fomos amadores. Desejávamos o presente, sim. Mas eu me alimentava de futuro. Você venerava o passado. Era lá que morava o perigo. Porque nenhuma releitura nos satisfaz por completo. Dos livros, que nunca mudam, quando os relemos, passamos para as partes mais interessantes, pulamos a parte chata e vamos direto ao clímax. Dos filmes, nada poderá se comparar à primeira vez que os assistimos. A releitura não tem o mesmo gosto, mesmo suspense, mesma paixão, muito menos as mesmas lágrimas.
Imagina uma releitura nossa, que não somos livro, nem filme. Imagina se eu ainda seria a mesma quando lida outra vez, tanto tempo depois. Sou metamorfose, sou "um milhão de pessoas diferentes de um dia para o outro". Idealizar algo tão deslocado e insano como nós é pedir ilusão.
E agora quando olho pro passado tão real, nada platônico, nada bonito, é conforto. É um alívio estranho de quem espera, de todo o coração, não precisar enfrentar releituras ou leituras tão cedo.

2 comentários:

Mima disse...

Reformulamos nossa vida inteira quando constatamos que as pessoas mudam. E nós mudamos. E isso pode ser nossa desgraça ou a melhor bênção do mundo. Mudamos.

Graças a Deus, nada permanece igual.

Beijo. (Muito bom ler e reler teus textos. Acho muito de mim neles.)

Caca disse...

Oi, Deyse! Estava navegando pelo google procurando algo sobre extremos opostos e tive a grata surpresa de cair aqui neste seu blog cheio de reflexões adoráveis e fecundas.Meu abraço e parabéns. Paz e bem.