segunda-feira, 5 de setembro de 2011

Mudando de assunto [ou Esse amor é notícia de ontem]


"Eu gosto de falar de coisas boas
e de momentos bons que virão...
São carapuças que me servem de sorriso."

Exceto pelo fato de que não, eu não gosto muito de falar do futuro. Ainda acho inseguro, feio, chato e ainda me dá preguiça olhar pra frente. Ainda olho mais pro retrovisor do que pro pára-brisas. É normal, dizem. Ninguém gosta de mudanças. Claro que sei que bons momentos virão. Sei que vai passar a melancolia e eu vou "sentir saudade de sentir saudade". O problema é que, por enquanto, continuo presa no mesmo assunto: ontem.

Pareço um jornal velho. Minhas manchetes nunca mudam. E meu assunto atual sequer daria uma boa notícia. Tenho certeza de que entedio meus amigos, porque entedio até a mim mesma. Dou voltas e risadas e mais voltas e paro no mesmo lugar. A essa altura, contra a minha vontade. E apesar de eu saber que a culpa de eu ser esse jornal de ontem ambulante é toda minha e de ninguém mais, preciso dividi-la contigo. Por hoje.

Hoje eu preciso dizer que a culpa não é totalmente minha. Porque, sabe, é o teu rosto que tá gravado em quase todos os lugares que eu freqüento. É o teu perfume que eu não consigo sentir em mais ninguém, porque é em ti que ele fica perfeito. É do teu carinho, abraço e ombro que eu sinto tanta falta. É tua mão segurando a minha que eu não tenho mais. É que quando eu ouço Legião Urbana, não sou eu; é um pedaço teu em mim. É que eu ainda me preocupo demais contigo, no trânsito, na estrada, há centenas de quilômetros daqui ou em casa dormindo, que seja! Me preocupo de dizer pra tu te cuidar - já que eu há muito não posso fazer isso.

Se eu não consigo mudar de assunto é porque nossas lembranças ainda são muito nítidas. Nossas, eu não as fiz sozinha. Lembro perfeitamente de termos sido nós certa época. Era uma vez nossas tardes, nosso dia, nossos livros, nossos planos, nossos sonhos, nossos erros, nossos acertos, nosso "pra sempre", e tantos outros incontáveis nossos. E até onde não há lembranças de ti, há lembranças da pretensão de fazê-las. Os lugares que eu queria que nós tivéssemos ido, as coisas que eu queria ter te dito, as cartas que eu queria ter te escrito, os presentes que eu queria ter te dado, as fotos que eu queria que nós tivéssemos tirado, as datas que eu queria que nós tivéssemos passado juntos, o incontável tempo que eu queria que nós tivéssemos durado.

E pra onde eu olho, vejo essas lembranças; sejam memórias concretizadas, sejam planos e sonhos. Vejo tua cara de sono, olhos inchados, cabelo desalinhado. Ouço aquela risada de malandro, que enruga o lado direito do teu nariz de um jeito que eu sempre queria beijar e tu nunca conseguiu fazer de propósito - parecia até um presentinho, que eu só podia ver quando te fazia sorrir de verdade. Ainda lembro de ti em cada cômodo da casa. E ainda não posso ir ao teu bairro porque, não importa pra onde eu esteja indo, minhas mãos e pés dirigem como se eu estivesse indo te ver, pegando ruas e atalhos [agora] errados, pregando brincadeiras de mau gosto em mim.

Se eu ainda não mudo de assunto, é porque nossos assuntos não acabavam mesmo tu sendo tão fechado e guardando quase tudo só pra ti. É que eu sei que existem momentos bons, boas pessoas e boas coisas me esperando em algum lugar do futuro, mas andar até lá vai ser cansativo. E a má notícia - a que mais dói - é saber que tu não vai estar lá comigo, na próxima edição do jornal. Dói e ao mesmo tempo consola saber que um dia tudo isso vai ser como notícia de ontem: vai passar como se nunca tivesse acontecido.

Pra conseguir mudar de assunto é preciso que eu mude muito. E, só por hoje, não estou disposta.

4 comentários:

Mima disse...

Porque somos dois maços de papel velho se lamuriando no banco de uma praça freqüentada por pessoas ocupadas demais pra nos notar, mesmo sabendo que jornais velhos às vezes são relíquias caras. Mas infelizmente, 'minha amiga jornal velho', em dia de hoje ninguém faz mais história nem nada. As pessoas só olham pra frente. E o que acontece, companheira de memórias, é que se a gente não se reciclar, a gente vira comida de rato de bueiro.

[mas eu digo a vc: a reciclagem é uma ótima alternativa. A gente pode ficar novinha em folha... - e quem sabe boas mãos, enfim, se importem...]

Beijos, minha Deysinha!

Laís Araújo disse...

Lindo o seu texto,infelizmente nada é como agente tanto quer,seguir em frente sem estar de mãos dadas com quem eramos tão acostumados e tão seguros,é difícil,da preguiça mesmo de seguir,de comprar um novo jornal!

Lia Araújo disse...

A notícia ruim, é que às vezes, não passa, Deyse! Adormece, ou você se acostuma...ou cansa, nem sei mais.

A notícia boa é que sempre existe gente que não gosta muito de jornal mesmo, e sempre vai preferir ler suas notícias de ontem e sempre... como aquele poema da Rita Apoena que você leu ano passado, as pequenas coisas, realmente importante não são escritas em jornais...

As pessoas meio que cansam de tanta tristeza e se surpreendem como você ainda não virou a página... tem coisa mais difícil que vira a página? terminar o capitulo, arrumar a mala, fechar a porta, dizer adeus?....

Aliás, respondendo seu tweet e plagiando não sei quem, dizer
a-Deus não é uma despedida... é deixar nas mãos de Deus o que você não tem mais força de cuidar. Talvez, um dia Ele te remeta de volta



beijos Deyse...

Rayssa Natani disse...

"Saudade de sentir saudade" Sei bem o que é isso! ;) Sua linda!